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Seguir o dinheiro pode ser mais efetivo que lei para combater as fake news
Por: Roberta Prescott - 25/06/2020

A internet brasileira não pode ter entraves ou particularidades que a destoe e a afaste do que se passa na rede em nível internacional, com a exigência de fornecimento de dados para uso de aplicativos ou regulação sobre conteúdo. Atacar o problema gerado pela disseminação de informações erradas passa pela investigação de quem está financiando as fake news e também pelo fomento da educação para que os cidadãos tenham pensamento crítico e consigam identificar o que é falso. 

Essas foram algumas das ideias compartilhadas por Eduardo Parajo, vice-presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet); Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS), e Aline Osorio, secretária-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), durante debate promovido pela In Press Oficina.

O webinar ocorreu nesta quinta-feira 25/06,  dia em que está programada a votação no Senado do PL 2.630/2020, de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e que tem relatoria do senador Angelo Coronel (PSD-BA), que apresentou relatório com alterações ao texto de Vieira.   

Parajo pediu que o Congresso Nacional tenha parcimônia ao tomar qualquer decisão e que entenda a necessidade de ampliar a discussão sobre o tema. “Toda a vez que vemos a criação de uma lei queremos colocar nela a solução para todos os problemas e isto com que se acabem criando leis com cem artigos, sendo que já existe legislação mais que suficiente. Foi debate grande que tivemos à época do Marco Civil da Internet e na Lei Geral de Proteção de Dados, que são dois marcos muito importantes no Brasil”, disse o VP da Abranet. 

“Entendemos que a discussão é importante e que a lei pode necessitar de algum ajuste para não se criar uma internet só do Brasil, com exigências descabidas como ter escritório no País, armazenamento de dados local, datacenter, identificação positiva, excesso de necessidade de reter dados das pessoas cujo vazamento gera problemas enormes”, acrescentou. 

Na mesma linha, Carlos Affonso Souza, do ITS, apontou que a internet não é terra sem lei e que nela se aplicam as leis específicas para a rede e também as criadas antes da internet. “A tese que o ITS vem defendendo é atacar o financiamento das fake news, é seguir o dinheiro e não legislar o conteúdo, mas focar em comportamento”, disse. Para ele, a lei deve ter uma redação mais focada, mais cirúrgica e tecnologicamente neutra. “O PL fala em SMS que é algo que mal usamos hoje; assim, a lei caduca de forma rápida.”

Conforme pontuou Aline Osorio, do TSE, a disseminação de informação falsas não é uma novidade, mas há uma realidade nova que é a de notícias fraudulentas que são artificialmente fabricadas e isto mudou muito com a alta velocidade de transmissão e a forma como a informação circula, seja por même, sem fontes, robôs. Há ainda, neste cenário, empresas criadas para disseminar as notícias falsas.

Em consenso, os participantes destacaram a necessidade de mais discussão na sociedade acerca da lei para não ter o risco de se legislar no calor do momento. “O combate ao que é chamado fake news vem de esforço coletivo da sociedade como um todo, incluindo educação virtual para detectar informações falsas no noticiário, porque hoje existe dificuldade grande em entender o que é uma informação errada”, assinalou a sócia-diretora da In Press Oficina, Patrícia Marins. 

Papel das empresas

Durante o debate, Parajo lembrou que as empresas que atuam hoje no mercado têm colaborado com o processo com o todo, ativando mecanismos que possam coibir as fake news, alterando políticas de envios. “Quem faz desinformação é minoria e não podemos penalizar a massa, maioria que usa, em virtude de alguns que usam mal a internet”, ressaltou.   

“Dentro da Abranet, sempre defendemos que qualquer remoção de conteúdo deve ser feita com ordem judicial, porque é complicado transferir remoção de conteúdo a uma plataforma, tirando o que é evidente e fácil para identificar. Sair removendo conteúdo aleatoriamente gera problema de liberdade de expressão”, defendeu Parajo. Ele acredita que o combate à desinformação possa se dar como foi o processo para a redução de spams, para a qual houve grande movimento do setor, junto com o Comitê Gestor da Internet, para criar condutas para as empresas.  

“Houve discussão no Congresso para criar lei específica de spam, mas no fim aconteceu. Foi melhor a articulação efetiva entre os interessados que criar uma lei que poderia perder rapidamente a sua eficácia”, comparou, chamando a atenção para o fato de que a sociedade toda tem de se interessar pelo tema e, como Souza apontou, a necessidade de seguir o financiamento. “Tem de existir uma série de ações; não adianta responsabilizar um lado da cadeia apenas.”

Para Souza, do ITS, o sentimento de impunidade ainda está atrelado à visão de que internet é terra sem lei, na qual é possível o anonimato. “É um mito que temos de ir quebrando. A Constituição Federal assegura a liberdade de expressão, mas veda o anonimato”, lembrou. “Para atacar robôs, o texto substituto fala em se ter certeza de que existe uma pessoa e a solução apresentada é das piores: exigir número de documento e de celular, mas isto exclui uma parcela da população. É amplamente discriminatório exigir número de celular para criar contas em aplicativos, além de inseguro e ineficaz, porque a fraude já ocorre”, comentou, ressaltando que não se pode colocar os robôs “em um balaio de ilicitude”, até porque existem contas automatizadas que são importantes para comunicação de empresas, entre máquinas etc.  

“Me preocupa muito um projeto que queira resolver todos os projetos e que transforme Brasil em uma ilha na forma como as plataformas devem operar, como obrigar aplicativo a ter escritórios no Brasil. Falta reconhecer que a internet é global. O que tem de criar é formas de responsabilizar os danos quando eles ocorram”, acrescentou Souza. 

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