Publicada em: 02/06/2020 às 19:00
Notícias


A hora e a vez das paytechs
Eduardo Neger

O presidente da Abranet, Eduardo Neger, publicou nesta terça-feira, 02/06, um artigo no jornal O Estado de São Paulo, sobre a hora e a vez das paytechs, que são empresas que prestam serviços financeiros pela internet. O site da Abranet reproduz a íntegra do conteúdo:

A Hora e a vez das paytechs

Uma das características principais de uma grave crise econômica é a possibilidade de acelerar processos, estimular mudanças e promover inovações a curto prazo. A pandemia da covid-19, por exemplo, motivou a adaptação rápida de diversos negócios para o e-commerce, e praticamente institucionalizou o home office tanto para empresas privadas como para órgãos públicos. O empresário ou gestor que duvidava dos resultados desses sistemas de trabalho foi obrigado a se reinventar para as atividades tivessem continuidade durante o isolamento social.  No caso do sistema financeiro, em relação aos meios de pagamentos, a história se repete. E não poderia ser diferente.

O momento que vivemos, apesar de adverso e carregado de medo e luto, é oportuno para o Governo Federal promover uma verdadeira e urgente digitalização no eixo nos meios de pagamento. É hora de se libertar, definitivamente, das limitações do uso presencial do sistema financeiro, das estruturas pesadas dos grandes bancos tradicionais, e focar nas facilidades da inovação tecnológica, com variadas formas de pagamentos eletrônicos e movimentações financeiras via canais digitais remotos oferecidas pelas Paytechs – empresas de tecnologia que oferecem serviços financeiros a seus clientes por meio de celulares e internet.

O próprio distanciamento social, medida considerada mais eficaz pela grande maioria das autoridades de saúde no mundo, usa a tecnologia como peça-chave para mitigar impactos econômicos da crise e combater a proliferação do novo Coronavírus, já que evita aglomerações e filas em agências bancárias.

Neste cenário, as paytechs representam o que há de mais moderno e eficaz, e são a cara do novo sistema financeiro mundial. Países desenvolvidos, como Estados Unidos e o Reino Unido, têm voltado seu olhar para esse nicho, especialmente, nesse período desafiador.

Na atual realidade do Brasil, as paytechs devem atuar como o principal meio para garantir o escoamento de crédito e o acesso aos auxílios emergenciais disponibilizados pelos bancos públicos, movimentações financeiras vitais para pessoas físicas e jurídicas no enfrentamento dessa crise sem precedentes. Mas as micro e pequenas empresas enfrentam dificuldades para acessar linhas de crédito oferecidas pelo BNDES, por exemplo, o que gera insegurança e incerteza no empreendedor sobre as chances de seu negócio sobreviver à pandemia.

Historicamente, os bancos são vistos como o único canal para operacionalizar as medidas de socorro à população. A crise ratifica a necessidade de mudança desse paradigma para um sistema capaz de atender mais pessoas e de maneira mais eficiente. Já existe no Brasil um sistema regulatório, implementado pelo Legislativo e operacionalizado pelo Banco Central, que permite esse avanço, mas é preciso que o Governo inclua isso na agenda.

Nas últimas três décadas, as micro e pequenas empresas desempenham um papel cada vez mais estratégico na economia brasileira e hoje respondem por 30% do valor adicionado ao PIB do país. A curva ascendente da importância dos pequenos negócios na geração de empregos, renda e na arrecadação de impostos vem desde 1985, quando a participação no PIB era de 21%.

É exatamente essa camada do mercado, com grande contribuição para a economia, que as paytechs incluíram no sistema financeiro. Por isso, conhecem muito bem as agruras e desafios enfrentados pelo segmento. As paytechs colocam no mapa uma parcela da economia brasileira historicamente esquecida pelos grandes bancos, permitindo a expansão de seus negócios. O Brasil tem hoje 45 milhões de desbancarizados e 24 milhões de autônomos, o que representa 55,8% do total do empresariado no país.

Outra característica relevante das paytechs é alta capilaridade. As milhões de contas digitais movimentam, em média, R$ 2,3 mil por mês (por conta). As paytechs atuam na ponta e estão presentes em mais de 5.500 municípios espalhados por todo território nacional, com alcance entre 40% e 60% da população. Essas empresas inovadoras são capazes de impactar positivamente a vida dos cidadãos brasileiros nesse momento singular em que enfrentam obstáculos graves como o pesadelo do desemprego e da queda de receita nas empresas.

Toda essa expertise, infraestrutura e dimensão estão à disposição do Governo Federal. Gratuitamente, com segurança de ponta contra fraudes e sem burocracia. O modelo de atuação das paytechs está alinhado à estratégia econômica proposta pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que visa a desburocratização de processos e uma maior abertura econômica.

Contudo, as primeiras tratativas do setor com o Banco Central, BNDES e Ministério da Economia ainda não avançaram. É preciso desatar os nós para o desenvolvimento desse setor que, apesar de jovem, já demonstra seu potencial de contribuição para o país, maximizado em meio à crise atual. Para soltar essas amarras, é preciso vontade política.

As conversas com os decisores segue sendo a linha de atuação da Abranet, principal entidade representativa do setor, e o ministro Guedes deu declarações públicas que demonstram seu entendimento sobre a capacidade de retorno que as paytechs colocam à disposição do país.

Entretanto, os grandes bancos ainda são tratados como prioridades, seja por motivos históricos ou outros, mas em face do potencial de desconcentração bancária, por meio da tecnologia, que as paytechs representam no sistema financeiro, isso precisa mudar. É hora de todos os agentes cooperarem e cada um aportar o que tem de melhor para contribuir. Assim, o governo e o país não perdem a oportunidade de disponibilizar os recursos de forma rápida, segura e pulverizada, sem risco de saúde e gratuita, sejam auxílios emergenciais ou microcrédito.

A pandemia ficará marcada como um momento de inflexão para o sistema financeiro mundial. É essencial que o Brasil aproveite a janela de oportunidade gerada pela crise da covid-19 para o incremento de um setor que já detém capilaridade expressiva no país e que necessita apenas de incentivos do Governo Federal. Um empurrão definitivo para contribuir de forma ainda mais decisiva no combate à crise e abrir caminhos para a tão necessária e esperada retomada econômica. As paytechs podem e querem continuar ajudando o país, ajudando os milhões de micro e pequenos empreendedores e as famílias mais necessitadas a atravessar a crise.

*Eduardo Neger, presidente da Abranet (Associação Brasileira de Internet)


Powered by Publique!