Atuação da Abranet permitiu o crescimento e amadurecimento dos provedores
Edmundo Matarazzo é do Conselho Consultivo da Abranet
A época da fundação da Abranet foi também o período em que as grandes prestadoras de serviço de telecomunicações, do grupo Telebrás, começavam a descobrir um negócio chamado comunicação de dados, ressaltou Edmundo Matarazzo, logo que começou a se recordar do ano de 1996 para o especial de 25 anos da Abranet. “Havia uma disputa muito grande entre a Embratel e as empresas estaduais para ver quem seria o monopolista desse serviço. Foi nessa discussão que o ministro das Comunicações da época, o Sérgio Motta, acabou interferindo e dizendo o seguinte: 'Calma lá, vocês estão falando de alguma coisa que não é serviço de telecomunicações, vocês não estão falando só de comunicação de dados, vocês estão falando do que está começando a surgir aí, uma tal internet. E a internet não vai ser monopólio, não vai ficar controlada por empresas de telecomunicações'. Foi uma decisão que ele tinha muito clara”, relatou.
Foi nesse contexto que Motta produziu a Norma 004/95, vinculada a um decreto-lei. "A Norma 4 foi vital à época e continua sendo importante para o desenvolvimento da internet brasileira. Por ela ter vínculo com decreto-lei, não é tão simples de ser alterada. E nesta resolução ele limitou o que era serviço de telecomunicações e o que poderiam ser as coisas novas, principalmente, a internet que estava nascendo. Eu acho que esse contexto foi o que permitiu que surgissem os provedores de internet e a própria Abranet”, apontou Matarazzo.
A Abranet defende essa resolução desde a sua criação, e a própria Norma 4 vem sendo um alicerce. “A disputa sempre foi com o setor de telecomunicações, que tentou criar alternativas à internet. As soluções vieram todas na plataforma de internet, que é uma plataforma aberta.”
Para Matarazzo, um ponto de inflexão na história e no desenvolvimento da internet foi a criação da World Wide Web, fazendo a internet ficar acessível a todo mundo. “Um marco importante é a criação da web e, em cima da criação da web, vem tudo que a gente conhece, como as plataformas de serviços, as redes sociais, os aplicativos, o streaming”, ressaltou.
Ao longo dos anos, todos os serviços que nasceram em cima da internet impuseram discussões relevantes sobre o próprio uso da internet e o papel dos provedores, exigindo, muitas vezes, que eles próprios mudassem. “Foram várias as tentativas de impedir ou complicar muito o crescimento dos provedores. Para você poder usar a internet e usar um provedor, você precisa de um enlace telecom da sua casa até o provedor. Isso no Brasil é serviço de telecomunicações e só pode ser prestado com autorização da Anatel", disse Matarazzo.
"Obviamente, no começo, principalmente na fase em que o mercado tinha só as grandes operadoras – as concessionárias e as espelhos –, ninguém tinha muita vontade, muito desejo de ter outros competidores prestando serviços de telecomunicações, principalmente prestando suporte para a internet. Isso só mudou quando a Anatel efetivamente abriu a possibilidade de ter uma licença, uma autorização e [determinou] que não tinha nenhuma necessidade de participação em leilão ou coisas muito complicadas, para que o provedor pudesse ter a licença de telecom para ele próprio fazer o link que não conseguia obter de outras empresas”, contou.
Matarazzo, na entrevista, alertou para a gestão das empresas de internet, com ênfase na dificuldade, principalmente, para os pequenos em entenderem o arcabouço de regras tributárias e de negócios. A internet atingiu um patamar e um volume muito grandes, não cabendo empresas muito pequenas. “No começo, todo mundo dizia que, se fosse uma empresa do Simples, já dava para ser provedor. Mas empresa do Simples não dá mais para ser provedor. O mercado cresce, o limite de faturamento do Simples é ultrapassado, então, não dá.”
Assim, o crescimento tem um preço. “É preciso profissionalizar, estruturar a empresa, precisa começar a recorrer a perícias de todos os tipos para poder ter o melhor desempenho na área contábil, na área fiscal, na área de recursos humanos, porque se emprega muita gente também. E esses são desafios que os pequenos têm que enfrentar, não são desafios fáceis, não.”
Primórdios
Em 1996, ano em que a Abranet foi fundada, Matarazzo participava na União Internacional de Telecomunicações (UIT) de uma comissão que elaborava os padrões de telecomunicações, de telefonia e os protocolos novos. Havia um esforço enorme, segundo ele, para tentar desenhar as telecomunicações do futuro. “E o desenho das telecomunicações do futuro era uma rede única em que você pudesse fazer qualquer coisa. Parece um pouco com a internet, né?”, brincou.
“Mas a área de telecom nunca conseguiu dar uma solução para isso porque, primeiro, é uma atividade que sempre foi tida como uma atividade restrita ao Estado e sempre trabalhou com padrões muito rígidos; então, o ciclo de produção era de quatro, oito anos para você ter uma mudança tecnológica. Quando a internet chegou, em menos de quatro anos, ela já tinha mudado tudo”, relembrou.
Quando a internet nasceu, a ideia da internet, contou Matarazzo, era fazer alguma coisa que telecom não atrapalhasse, uma plataforma que usasse telecom do jeito que ela estivesse e que fosse fazer o que se quisesse em cima dela. “A plataforma do início da internet pregava o seguinte: independência do tipo de telecom que eu estou usando. E aí ela atropelou telecom, porque passou a usar qualquer um: linha análogica, linha discada, qualquer telecom que você colocasse”, disse.
O que esperar
Questionado sobre o que esperar da internet nos próximos 25 anos, Matarazzo apontou pontos que julga bastante relevantes e que ficaram em evidência na pandemia da Covid-19. “Primeiro, eu não preciso estar presente em determinado lugar para fazer alguma coisa. A gente usa muito o recurso do vídeo, mas a gente já está falando em holograma, em realidade virtual. Então, imagina uma reunião em um ambiente virtual onde todos os avatares estão presentes e interagindo. Não é o vídeo que a gente conhece hoje, é um outro ambiente, um ambiente com outras capacidades e outras possibilidades de percepção fantásticas”, disse. “Eu acho que a ideia do smartphone não tem nada a ver com o serviço móvel celular, o smartphone é um elemento da internet e vai evoluir segundo a internet. A gente já vê modelos de smartphone projetando holograma ou tentando projetar holograma”, completou.
Além disso, ele acredita que a velocidade de criação aumenta muito com a testagem cada vez maior de protótipos no ambiente virtual. Ele citou ainda a supervisão a distância, com o uso de drones para controlar tráfego, fazer reparos, controlar fogos, supervisionar agricultura, que também contará com máquinas automáticas e autônomas, sem a necessidade de uma pessoa conduzindo um trator.
“Eu acho que esse ambiente virtual é muito poderoso, porque estará presente, inclusive, nos lugares que não têm nada, poderá ser usado no meio do deserto, basta conseguir chegar com internet. A nova geração de satélites vai ampliar ainda mais a possibilidade de acesso à internet. Aliás, toda a infraestrutura de telecom hoje gira em torno de garantir mais acesso, mais conectividade à internet. Então acho que isso vai só popularizar-se cada vez mais e vem muita coisa nova por aí.”